(Publicado originalmente em galego em Nós Diario a 10/05/2025. Traduzido com permissão, pelo autor, e revisto por Cláudia Salgueiro.)
Há décadas que em cada Primavera brota a defesa da energia nuclear. Qualquer fisga serve para filtrar a mesma ideia, com razões volúveis, mas com objectivos invariáveis que nem sempre são visíveis.
A falsa ideia de que não é poluente decorre da sua não inclusão nos controlos de emissões do protocolo de Quioto, porque não utiliza fósseis na produção. No entanto, são utilizados em abundância na extracção do urânio, o enriquecimento, transporte, reprocessamento ou a própria construção da central. Além disso, a energia nuclear não é sustentável porque a geração de resíduos é inevitável durante todo o processo, ocorrem frequentemente fugas, são mesmo libertados radionuclídeos na água ou no ar que podem estar ativos durante milhares de anos, e os resíduos mais perigosos são uma herança para as gerações futuras, armazenados nas centrais indefinidamente, mesmo após a cessação da sua atividade.
A miragem de que reduz a dependência exterior decorre de um critério de cálculo energético não utilizado para outras fontes: as importações de combustível nuclear não são contabilizadas como importações, apenas como produção nacional. Mesmo que todo o combustível fosse importado não se refletiria na dependência energética, ao calcular a produção a partir do calor gerado na fissão e não do potencial energético do combustível (que é como é calculado, no entanto, no caso do gás e do petróleo), e ao estabelecer a dependência por uma relação entre importação de recursos e a utilização total de energia primária. Além disso, as reservas de urânio são escassas e estão quase 99% concentradas fora da União Europeia.
A sua competitividade é igualmente sublinhada. É o que aponta, por exemplo, o Foro Nuclear, lobby do qual fazem parte as maiores empresas de electricidade do país, as mesmas que, quando estão interessadas, também defendem as bondades das energias renováveis, dos ciclos combinados, da repotenciação de barragens… O seu negócio é vender energia, não importa a fonte, o interesse está no mercado e na rendibilidade do capital. Os cálculos da rendibilidade atendem apenas aos custos de operação das centrais, mas não outros, como a custodia dos resíduos durante a sua actividade (dentro de uns séculos nem se garante a existência das empresas) ou o desmantelamento das centrais. Estes sobrecustos assume-os a sociedade, mediante a acção do estado que já as protegeu em vários momentos, como quando a moratória nuclear as salvou da bancarrota socializando as perdas com uma sobretaxa nas tarifas. Insistir na segurança das centrais é assustador, tendo em conta o historial de acidentes nucleares, o facto de nenhuma seguradora os cobrir, ou a idade das actuais instalações.
A afirmação da garantia de subministro das nucleares poderia fazer-se também para o ciclo combinado, a eólica, a hidráulica ou a fotovoltaica. É muito complexa uma desconexão imediata de qualquer delas no sistema eléctrico actual, construído à medida do negócio privado, concebido para aumentar a oferta e não restringir a procura ou mesmo fomentá-la. Um sistema inviável a médio ou longo prazo que acabará por obrigar a uma revolução da consistência, como indicou E. Altvater, uma reorganização dos usos de energia a todas as escalas (transporte, urbanismo, formas de produção…), indo além da eficiência na gestão da procura ou de uma simples moderação do consumo.
